top of page

Filipenses 2 - Discipulado: a imitação de Cristo


Chegamos no capítulo que tem os versos mais importantes para entender não somente o próprio capítulo, mas para compreender toda a carta aos filipenses, como também, envolve todo o foco da vida cristã: a imitação de Cristo. Os versos 5 ao 11 do capítulo 2, revelam o enredo bíblico desde Gênesis, passando pelos profetas e concluindo toda a História da redenção e gloriosa de Cristo Jesus. Vamos à exposição!


(v. 1 - 4) - Paulo inicia o capítulo fazendo quatro indagações. Estas revelam o esforço que Paulo fazia para que a igreja de Filipos se mantivesse unida. Sabemos que havia um certo desentendimento na igreja (Fp 4:1-3), provavelmente porque Epafrodito quando levou as ofertas para Paulo lhe esclareceu a situação; Paulo, então, levanta essas reflexões para os irmãos perceberem que o problema seria resolvido não com ameaças ou regras, mas com um coração espiritualmente saudável. Uma resposta positiva à essas indagações mostraria que era possível que os irmãos vivessem em paz mutuamente e trabalhassem por um só propósito.

No capítulo 1, Paulo mostra a importância de viver uma vida dedicada à Cristo, já no 2, ele vai abordar como vivemos esta vida. No 1, já notamos que uma vida dedicada à Cristo reflete à uma vida dedicada à Igreja, no cuidado com os irmãos. E no 2, ele vai embasar esse argumento pela vida do próprio Cristo, e depois dar exemplos claros de como viver uma vida dedicada ao Senhor: “[...] mas preocupem-se também com os interesses alheios” (v. 4b). A Igreja primitiva nos dá um belo exemplo de como os irmãos viviam:


Todos os que criam estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam suas propriedades e fazendas e repartiam com todos, segundo cada um tinha necessidade. E, perseverando unânimes todos os dias no templo e partindo o pão em casa, comiam juntos com alegria e singeleza de coração, louvando a Deus e caindo na graça de todo o povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar. (Atos 2:44-47)


Quando notamos a radicalidade que os irmãos da Igreja primitiva tinham em sua vida por Cristo, percebemos o quanto nos dedicamos muito pouco. No entanto, esta visão não é pessimista, pois, de fato, a Igreja se desenvolveu ao longo da História, contudo, precisamos refletir e analisar se agimos buscando esse ímpeto de olhar para o meu irmão de forma radical, ou seja, vê-lo como alguém a quem eu deva tratar como família, pois temos o mesmo Pai.


A phrónesis [φρόνησις] de Cristo

(v. 5) - Este é um ponto do texto crucial para se entender toda a motivação, prática e desejo da vida cristã. A imitação de Cristo no discipulado não é um mero sentimento ou uma mera atitude. Nesta primeira parte, vamos focar apenas no versículo 5: “tenham a mesma phrónesis demonstrada por Cristo Jesus”. Esta palavra no grego é de uma compreensão complexa. Primeiramente, ela foi traduzida pela ARA como “sentimento”. O mero sentimento não explica exatamente o que o apóstolo Paulo quis dizer com a palavra phrónesis. Sentir como Jesus não implica diretamente em um ato pós sentimento. Podemos sentir, desejar, e no entanto, não agir. Criou-se, portanto, a insuficiência de se explicar a magnitude da palavra phrónesis. A NVI, como também a NVT, observando este problema, traduziram como “atitude”. O que também não explica a intenção de Paulo quando usou a phrónesis. A atitude pode ser feita mesmo sem a motivação correta, ou melhor, sem o desejo de tomar certa atitude que é boa. A palavra “atitude”, então, não traduz adequadamente a intenção do apóstolo em explicar o que é esse termo que ele se refere como sendo algo que Jesus fez, isto é, a phrónesis de Cristo Jesus.

A phrónesis é, portanto, um tipo de atitude motivada por um sentimento correto. Ou seja, Cristo desejou, quis realizar e executou a phrónesis. Na filosofia grega, phrónesis era entendido como uma “sabedoria prática”. A mesma phrónesis de Cristo é não somente a motivação correta, mas a capacidade e o desejo de cumprir o bem a alguém, com plena consciência do que é correto. É desejar cumprir o que é bom e justo. E portanto, a phrónesis de Cristo é o completo oposto do homem miserável do capítulo 7 de romanos. O homem miserável não consegue realizar o bem, mesmo que sinta o desejo de realizar. Sua atitude não corresponde com a vontade de fazer o bem. Paulo, então, quer mostrar aos filipenses o ápice do que é agir bem. A phrónesis de Cristo, dessa forma, é o ápice de todo cristão que imita a Cristo e é seu discípulo.


Afinal, o que deve ser imitado de Cristo?

(v. 6 - 8) - Se desenvolve, porém, um problema teológico quando referimos a imitação de Cristo com o seu esvaziamento, a κένωση [knosi]. Vamos ao problema. O pensamento quenótico (knosi) dá a ideia de que o homem para ter a mesma phrónesis de Cristo, precisa se esvaziar e, portanto, só assim é possível que O imitemos. Em contrapartida, a knosi, para o apóstolo, é algo que apenas é possível para Deus. Apenas um Ser que tem em Sua natureza a glória, preeminência e senhorio é capaz de esvaziar-se. É uma atitude que se dá apenas a quem é cheio. O homem, no entanto, já se encontra vazio e, portanto, sua natureza, desde a Queda, apenas deseja ser senhor, mas este é um requisito só de Deus, e não do homem. A knosis de Cristo é o seu esvaziamento, isto é, Jesus preencheu o requisito para ser servo, ou seja, se tornou homem, apesar de ainda ser Deus. O homem, por sua vez, preenche o requisito apenas de servo, mesmo que ele não tenha a atitude de servir. Em que isto implica na vida do cristão? Ora, Jesus assumiu a posição de servo e nasceu como ser humano (v.7), isto é, então, Sua humilhação. A phrónesi do homem não é o esvaziamento (knosi), pois já é humilhado por sua posição natural, precisa, no entanto, ter a phrónesis de Cristo, ou seja, ser um servo como Ele foi. A phrónesis que devemos imitar de Cristo é, portanto, a obediência a Deus (v.8).

Jesus é o Deus que se fez homem, para ensinar ao homem como fazer bem (phrónesis) o único requisito que o homem pode preencher, que é ser servo. O homem sendo vazio, não pode ser Deus, apenas aprender de Deus como é ser homem corretamente. Ora, “todos os servos são homens, mas nem todos homens são servos” (Jonas Madureira, p.153), mostrando assim, que para o homem aprender a ser servo, deve aprender com o homem-Deus a maneira correta de servir. Esta é a phrónesis de Cristo Jesus que o apóstolo Paulo quer que os filipenses imitem.

Estes versos refletem o contraponto da história da Queda. Jesus, diferente do primeiro Adão, “não considerou que ser igual a Deus fosse algo que devesse se apegar” (v.6). A desobediência do primeiro casal se deu porque satanás estimulou o desejo de serem como Deus, “[...] e desejou a sabedoria que ele lhe daria. Assim, tomou do fruto e o comeu” (Gn 3:6). O primeiro Adão desejou ser como Deus, enquanto o segundo Adão mostrou o que o primeiro deveria ter feito: obedecido.

Alguns estudiosos dizem que esse poema era usado como um hino na Igreja primitiva baseado no Servo sofredor de Isaías 52:14-53. Jesus foi o homem que nutriu o desejo profundo de ser servo e nos ensinou isso em toda Sua caminhada: “Pois desci do céu para fazer a vontade daquele que me enviou, e não minha própria vontade” (João 6:38). Portanto, ter a mesma phrónesis de Cristo Jesus é imitar o jeito que Ele serviu.


(v. 9 - 11) - O objetivo da knosis foi dar glória ao Deus Pai! Jesus, por meio de Sua obediência, foi exaltado à mais alta honra, tendo colocado Seu nome acima de qualquer outro nome. Isto lembra Seu ensinamento de que:


“Neste mundo, os reis e os grandes homens exercem poder sobre o povo e, no entanto, são chamados de seus benfeitores. Entre vocês, porém, será diferente. Que o maior entre vocês ocupe a posição inferior, e o líder seja o servo. Quem é mais importante, o que está à mesa ou o que serve? Não é aquele que está à mesa? Mas não aqui! Pois eu estou entre vocês como quem serve.” (Lc 22:25-27)


Pense que, na ética do reino, o que mais serve ao seu irmão é o mais importante, e portanto, ocupa cargos superiores. O ensinamento de Jesus virou a lógica do mundo de ponta-cabeça. Jesus é o mais glorificado porque é o modelo de servo perfeito, ou seja, Ele ter assumido posição de servo e ter sido obediente até a morte, “Deus o elevou ao lugar de mais alta honra [...]”.


(v. 12 - 13) - Pode ser que se levante o questionamento: “como é possível para nós, seres humanos, imitar a Cristo desta forma? Ele cumpriu estes ensinamentos supremos pelo fato dEle ser homem-Deus.” É aí que entra a ação do próprio Deus em favor de Seus filhos. Cumprir as exigências de seus mandamentos é impossível para os homens; o homem salvar a si mesmo é impossível; contudo, para Deus tudo é possível. (Mt 19:23-26)

O apóstolo Paulo lembra aos filipenses para permanecerem seguindo suas instruções mesmo que de longe, e continua dizendo para os irmãos trabalharem com afinco, a fim de desenvolver sua própria salvação. E no ensinamento de Paulo é gerado no cristão dois tipos de princípios para trabalhar a própria salvação: 1. obedecendo a Deus com reverência e temor (v.12),; 2. e o que traz conforto ao coração: “Pois Deus está agindo em vocês, dando-lhes o desejo e o poder de realizarem aquilo que é do agrado dele” (v.13). Chegamos, portanto, no cumprimento da mesma phrónesis de Cristo Jesus. O que antes te deixava desesperado: “Como vou imitar a Cristo?”, agora te dá esperança: “Tendo consciência de que Ele age dentro de mim, me dando DESEJO e PODER de realizar Sua vontade”. Se a phrónesis significa a motivação correta, como também o desejo de realizar e a capacidade para isso, Paulo conclui, então, que: pela graça de Deus você pode imitar a Cristo; você pode ser um discípulo que tem o mesmo sentimento/atitude de Cristo Jesus.

A pastora Anne Francis tem o costume de ensinar que há uma graça que nos impulsiona e permite realizarmos a obra de Deus. É esta graça que o apóstolo Paulo se referiu quando escreveu o versículo 13.


(v. 14 - 30) - Nestes últimos versos, Paulo dá aos filipenses diversas aplicações práticas para a vida em comunidade. Além disso, apresenta dois grandes exemplos de pessoas que seguem e imitam a Cristo: Timóteo e Epafrodito. Timóteo se preocupava sinceramente com o bem-estar dos filipenses, enquanto outros se preocupavam apenas consigo mesmo (v. 20-23). Eles arriscaram suas vidas pelo serviço à igreja de Filipos, inclusive, Epafrodito quase morreu, e de fato, ele estava disposto a isso (v. 29-30). Os exemplos que Paulo dá, de Timóteo e Epafrodito, é um contraponto para o argumento do próximo capítulo, onde o apóstolo refuta alguns falsos mestres que se gloriavam em seus próprios esforços.


Esta lição nos ensinou que para ser grande no Reino de Deus, precisamos primeiramente ser o menor dos irmãos. Jesus nos mostrou uma ética completamente diferente do mundo: desejar glória, poder e status é o prenúncio de Queda, enquanto desejar servir, imitando ao Senhor Jesus, é a motivação correta, e seu resultado é participar da glória dEle (Mt 19:28-29).


Que a graça salvadora do Senhor Jesus esteja nos dando desejo e condições de realizar a vontade de Deus!

Posts recentes

Ver tudo
Post: Blog2 Post
bottom of page