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Martin Luther King Jr: pregando a justiça social como obra do Reino de Deus

Atualizado: 5 de nov. de 2022

Martin Luther King Jr (1929-1968) nasceu em Atlanta, Geórgia. Filho de Martin Luther King e Alberta Williams King. Foi essencialmente um pastor e pregador batista que lutou pelos Direitos Civis nas décadas de 50-60, influenciando toda uma nação.
Influência familiar
King Jr. veio de uma linhagem de pregadores que proclamavam o evangelho que promove justiça social, tendo seu bisavô, Willis Williams na década de 1840, já no Estado de Geórgia, proclamando a justiça do Evangelho. Williams gerou A. D. Williams, avô materno de King Jr. O avô de King Jr cresceu consciente da relação social que se passava os afro-americanos, como também da segregação racial no Sul dos EUA. Havia uma certa apatia dos afro-americanos relacionado aos seus próprios problemas sociais, e portanto, um afro-americano consciente das mazelas da sociedade era constantemente supervisionado. Desta forma, A. D. Williams, com sua forma de enxergar o mundo, afetou seu genro, Martin Luther King, o que influenciou diretamente na visão de mundo de King Jr. Garth Baker-Fletcher vai dizer que:

Williams acreditava em protestos políticos e os praticava como algo necessário aos negros... Essa capacidade da família Williams-King de fazer a diferença positiva na dignidade dos negros era uma parte importante do ambiente dentro do qual Martin Luther King Jr. cresceu. (apud Alfonza W. Fulwood, 2020, p.554).

Estilo de pregação afro-americana
Apesar de sua mensagem social e política ir além dos púlpitos e chegar às praças públicas, a homilética de King não foi diferente da tradição afro-americana de pregação, na verdade, ele elevou-a. Sua pregação do evangelho social, portanto, teve relevância por causa da tradição da Igreja - sobretudo dos pregadores negros (LEIA AQUI NO BLOG SOBRE JOHN JASPER) -, desde o século 19 enquanto havia escravidão, de denunciar as injustiças. Desta forma, o historiador Henry H. Mitchell observa que a relevância social da Igreja afro-americana não é um "fenômeno novo", pois, segundo Fulwood, a Igreja "desempenhou um papel significativo na formação de reformas sociais, políticas e econômicas." (2020, p.563).
A pregação afro-americana é, essencialmente, voltada para a proclamação do Reino como combativo diretos dos males sociais. Inclusive, a maioria dos abolicionistas, antes da Guerra de Secessão (1861-1864), eram majoritariamente de grandes pregadores afro-americanos. Estes lançaram as bases, tornando-se precursores do sonho de igualdade social de King. O bastão da homilética foi passado para as gerações de seguintes de pregadores, chegando às mãos de Martin Luther King Jr.
King não é um ativista, mas um pregador do Evangelho. Em suas próprias palavras: "Eu sou... o filho de um pregador batista, o neto de um pregador batista e o bisneto de um pregador batista. A Igreja é minha vida e eu dei minha vida à Igreja". O incomodava o fato de ser visto como um líder dos direitos civis mais do que como um pregador.

Contexto Social: Segregação racial nos EUA
Aos 26 anos, King aceita o convite para servir como pastor da Igreja Batista em Alabama, no ano 1954. Neste período ocorria um aumento dos protestos afro-americanos contra a segregação racial oriundas das 'leis de Jim Crow', que eram leis estaduais que proibiam o convívio entre negros e brancos nos Estados do sul dos EUA. Desta forma, King se sentiu intimado em se aprofundar em combater a injustiça social ocasionada pela segregação. Então, no ano de 1960, preocupado com as questões relativas aos direitos civis, percebeu o pouco tempo disponível para cumprir os deveres pastorais em uma igreja local, tomando a decisão de renunciar seu cargo. Ele disse para a congregação: "A história empurrou algo sobre mim do qual não posso me afastar".
Neste período de seis anos pastoreando, um dos marcos que o fez se dedicar à luta pela liberdade, foi o caso de Rosa Parks, em 1955, que recusou-se a entregar seu assento, em um ônibus segregado, a um passageiro branco. As autoridades a prenderam. O ato de Parks provocou uma série de eventos que começaram com o boicote aos ônibus de Montgomery. Parks inspirou toda a comunidade afro-americana na cidade a protestar. Líderes das comunidades elegeram Martin Luther King Jr. à presidência da recém organizada Associação para Melhoria de Montgomery. Após os boicotes, King foi elevado à proeminência nacional.
King sempre optou em buscar métodos intelectuais para resolver os males sociais. Considerando diversas teorias éticas e sociais, "ele resolveu que o "método da não violência era uma das armas mais potentes disponíveis para os oprimidos em sua luta pela liberdade.[...]" (2020, p.557). Ele empregou o protesto pacífico como intenção de causar uma crise, para assim, criar uma oportunidade de negociação. O ato de não responder à violência com violência, gera constrangimento por parte de quem tenta oprimir. O silêncio frente a um agressor verbal, dá a sensação de desconforto, criando a necessidade de ou agredir mais violentamente ou de inflexão. Ora, a agressão não estava nos planos de King, restando à ele influenciar mais protestos pacíficos para buscar garantir a reconciliação e a justiça. Este tipo de filosofia se espalhou pelas faculdades afro-americanas em todo país e deu origem ao movimento estudantil não violento.
Tudo isso foi com muito sacrifício, mesmo que tenha mudado o curso da história americana, pois a partir de seu reconhecimento nacional, surgiram diversas leis que aos poucos foi desmantelando a segregação. Digo que isto foi com muito sacrifício, pelo fato de King ter tido inúmeros motivos para desistir desse sonho de liberdade. Em 30 de janeiro de 1956, uma bomba explodiu, destruindo parte de sua casa. Constantemente recebia ameaças de morte e onde chegava era atacado por supremacistas brancos sulistas, tendo sido rotulado de comunista (lembrando que este período dos anos 50-60 foi o auge da Guerra Fria, portanto, quaisquer pessoas que saíssem do padrão do 'estilo de vida americano' era assim rotulado - qualquer semelhança com a situação atual do Brasil é mera coincidência).
A Convenção Nacional Batista dos EUA rejeitou a ação social de King. As diferenças ideológicas e políticas dentro da Convenção ocasionou em um grande racha, assim, a Convenção Nacional Batista Progressista foi fundada sob a liderança de King. Acumulando muitos inimigos, Martin Luther King Jr. no dia 4 de abril de 1968, aos 39 anos de idade, foi assassinado com um tiro disparado por James Earl Ray, enquanto estava na varanda do Hotel Lorraine, em Memphis.
King fez seu discurso "Eu fui ao topo da montanha", na véspera de sua morte, em apoio aos trabalhadores do saneamento em Memphis.

Eu não sei o que vai acontecer agora. Temos dias difíceis pela frente. Mas isso não importa para mim, porque eu já estive no topo da montanha. Como qualquer outra pessoa, gostaria de viver uma vida longa. Mas eu não estou preocupado com isso. Eu só quero fazer a vontade de Deus e ele me permitiu subir a montanha. Eu vejo a terra prometida. Eu posso não chegar lá com você, mas quero que você saiba hoje à noite que nós, como povo, chegaremos à terra prometida. Estou feliz nesta noite porque não estou preocupado com nada. Eu não estou com medo de homem algum. Meus olhos viram a glória da vinda do Senhor. (2020, p.559)

Enquanto tentar realizar seu sonho lhe custou muito, King foi reconhecido por seu trabalho de reforçar o caráter moral daquela nação. Recebeu prêmios e honras por seu esforço em trazer a dignidade humana a todos os norte-americanos. Também, algumas leis federais foram aprovadas devido à influência de King, como: Lei de Direitos Civis, proibindo a discriminação no emprego e instituições públicas; Lei do Direito ao Voto, restaurando e protegendo o direito ao voto; e Lei da Moradia Justa, proibindo a discriminação de moradias em relação a vendas e aluguéis. Com certeza, esses ganhos representaram a realização de um sonho de um pregador batista.
O incidente com Rosa Parks desencadeou a ideia de justiça social de Martin Luther King Jr. o que impactou uma nação.

Fundamentos Teológicos
Não considerava totalmente o liberalismo nem a neo-ortodoxia. King acreditava que, em suas palavras, "Uma compreensão adequada do homem não é encontrada nem na tese do liberalismo nem na antítese da neo-ortodoxia, mas numa síntese que reconcilia as verdades de ambos" (apud King, 2020, p.565). Esta postura teológica serviu à sua pregação social do evangelho.

6 características na Homilética de Dr King
1. Conciliou o ensino acadêmico dos seminários brancos e os inúmeros cursos de homilética que participou com a tradição da pregação negra. Fulwood chamou de modelo híbrido, isto é, a junção das duas tradições.
2. Teologia personalista. Esta tem a ver com a sua exposição à teologia liberal. Apesar disto, King não seguia a ideia liberal de o homem não ser corrompido pelo pecado original, mas sustentava a ideia personalista de que a humanidade é feita à imagem de Deus, e portanto, deve ser tratado com dignidade, valor e importância. Sobre esta ideia ele diz: "nunca devemos esquecer que há algo dentro da natureza humana que pode responder à bondade, que o homem não é totalmente depravado; para colocá-lo em termos teológicos, a imagem de Deus nunca desapareceu totalmente".
3. Beber de uma coleção de canções de negro spiritual, narrativas, poesia e testemunhos. Gêneros literários e culturais que destacavam a história afro-americana. Fulwood diz que "Esse corpo de memória e experiência coletivas fornece uma janela para os sistemas de crenças dos afro-americanos sobre Deus, o sofrimento e uma esperança escatológica de um dia melhor" (2020, p.567).
4. O patriotismo. Ele dedicou partes de seus sermões à tradição patriótica, como a Constituição Federal e a Declaração de Diretos, a Declaração de Independência e a Abolição da Escravatura. Nas pregações havia os princípios de uma nação fundada na ideia de liberdade como um "direito inalienável". Além de estar pregando o evangelho, apelava à verdadeira ideia que o EUA devia se basear segundo seus próprios princípios de liberdade. King sempre citava as palavras dos Pais Fundadores e dos autores da Constituição dos Estados Unidos. Em seu famoso discurso "I have a dream", ele diz: "Eu tenho um sonho de que, um dia, esta nação se erguerá e viverá o verdadeiro significado de seus princípios: [...] que todos os homens são iguais".
5. Poder da linguagem. King se baseou na opinião de Agostinho de que a religião era sobre a persuasão pública. Portanto, o poder da linguagem como pressupostos retóricos fundamentaram a pregação e elevou sua eficácia.
6. O uso da voz. O estilo de pregação afro-americana é comparada a musicalidade. "King usou sua voz como um instrumento de corda, com uma variedade de cadências, tons ou melodias transmitidas por seu barítono de alcance baixo, médio e alto." (2020, p.570). Essa "musicalidade homilética" é herança da tradição homilética antiga.

Conclusão
Sua teologia e pregação influenciou diversos outros pregadores, que passaram a enxergar o evangelho não mais à parte dos problemas sociais. Portanto, pregar o evangelho e abordar questões cotidianas de injustiças são sinônimos. Como cristão, sermos indiferentes com os problemas da sociedade, não passa de incoerência. Nesse sentido, essa compreensão fornece um modelo de um evangelho social, e põe a Igreja como um "ministério de ação social", que não desassocia a pregação do púlpito de questões que são preocupantes e podem atingir a dignidade do ser humano.


















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